Deduzindo os fatos
É impressionante como o ser humano tem a capacidade de deduzir fatos e situações, sem embasamento suficiente. Por favor, não iniciem as teorias de sexto sentido feminino, pessoas ultrassensíveis ou qualquer parâmetro similar. A questão não é se há pessoas mais intuitivas que as outras, mas sim que todos estão sujeitos a cometer graves erros dedutivos.
Muitas vezes se acusa a sociedade dessa mesma dedução danosa, especulativa e insensata, mas comete os mesmos erros que se sentem vítimas.
Um fato, um relato, uma aparência, uma única versão da história não são suficientes para dimensão precisa sobre uma situação ou pessoa, mesmo assim, não há pudor nas especulações. Várias frases se tornaram lugares comuns, e podem ser usadas para descrever algumas pessoas, sem conhecer profundamente a vida de cada um: "Tal pessoa é muito acomodada", "Essa pessoa é muito inteligente", "essa pessoa não gosta disso", entre outras. As mais constantes afirmações fazem parte do cotidiano, sem nenhuma cautela. A questão não é se a afirmação é verdadeira, mas está em não conhecer a situação como deveria para presumir as mesmas.
Sem conhecer a vida do casal de namorados, comenta-se que esses não se casarão. Por qualquer justificativa. Quando esses se casam e esse é duradouro, as velhas conversas são esquecidas, inclusive negadas. Qualquer fato é motivo para uma série de teorias, fofocas, conversas paralelas. Se o casamento é muito precoce, gera boatos. Caso a pessoa demore para se casar, também sofre especulação. É inevitável. Durante minha vida convivi com várias pessoas que se irritavam com facilidade quando se especulava ou se intrometia em sua vida, mas com facilidade reparavam, especulavam e concluíam fatos sobre a vida dos outros. São atitudes que envolvem pessoas de todas as idades e de qualquer local do país. Trata-se de um mito acreditar que ocorre apenas em pequenas cidades do interior. Os cosmopolitas compartilham da mesma atitude, está ligada ao ser humano, e não a idade ou condições geográficas inserida, mas característica humana.
Alguns sabem tudo que irá acontecer com uma pessoa que se viu apenas uma vez. Outros, presumem conhecimento de pessoas ou fatos que não acompanham há muito tempo.
Há certeza de conhecimento sobre tudo, mesmo sem ter certeza sobre a própria vida.
É evidente que atirando o tempo todo, é possível acertar o alvo algumas vezes, mas os erros, além de muito maiores, tendem a serem danosos.
Um simples comentário, feito à uma pessoa ou sobre ela, pode causar um grande dano. Uma informação desencontrada tem a capacidade de gerar no senso coletivo impressões completamente equivocadas, com possibilidade de afetar relações familiares, pessoais, amorosas e inclusive profissionais. A palavra é uma grande arma, para o bem e para o mal.
Outro problema é basear todas as situações e contextos em seus valores e visão de mundo. Em outras palavras, é medir os outros com sua régua.
Uma única informação não é suficiente para tantas certezas, mas não importa, para aqueles que adoram deduzir e propagar suas "brilhantes" deduções. Podem até não serem feitas com má intenção, o que não impede de serem prejudiciais. Uma biografia de mil páginas não pode ser resumida por uma leitura da página 135, mas isso acontecem constantemente.
É possível que o comentário infeliz quebre uma luta de anos, de uma pessoa, buscando construir uma imagem. Ninguém sabe os motivos de alguma pessoa lutar a favor ou contra determinada estereótipo. Ou não mínimo, não querer falar ou que falem de determinado assunto.
As relações pessoais são muito mais complexas e profundas do que o que se viu em um único momento, em uma cena, uma foto, um comentário em uma rede social. O mesmo vale para as pessoas.
Você conhece alguém que nunca se casou, o que se casou mas não teve filhos, alguém que está com uma pessoa com diferença de idade considerável, ou alguém que se casou várias vezes. O primeiro ponto, é que as escolhas e/ou resultados da vida da pessoa, não interessa a ninguém, mas mesmo assim, há uma tentativa quase inevitável de se criar explicações para esses fatos, na maior parte das vezes sem nem mesmo conversar a respeito com os envolvidos, aqueles que podem falar com maior propriedade sobre o tema (é obvio que é um direito dessa pessoa não ter o desejo de comentar). Cada vida é única, cada caso ocorre de maneira específica, mas os "donos da situação", os gurus da verdade, padronizam todos os casos, sem uma análise sensata, e questiono inclusive se deveriam perder tempo analisando o que não lhes interessa.
Algumas vezes se fala tanto de alguém por inveja, em outros, pode não ser esse o motivo, mas se cria espaço para pensar que esse seja o motivo.
Dentro dos exemplos mencionados acima, uma dessas pode servir com maior amplitude. Um casal que não teve filhos. Muitos podem especular que o fato nunca ocorreu porque eles não gostam de crianças, e inclusive espalhar tal notícia, contudo, muitos dos que fofocam e especulam sobre a vida alheia, provavelmente não sabe que esse casal queria muito ter filhos, tentou de todas as formas possíveis, mas não conseguiu. Um comentário estúpido, como o fato de não gostar de crianças, ou algo do gênero, pode chatear bastante um dos membros do casal, ou os dois. Situação desagradável, que poderia ser facilmente evitada, se não fossem tantas deduções.
Todos estamos sujeitos a cometer erros, dizer algo desagradável, prejudicar alguém. A questão está em tentar evitar, diminuir as chances de estragar o dia de alguém, de ser o indesejado, o vilão na vida de um ser humano. Não interessa a intensão, a palavra desenfreada causa danos, mesmo revestida de ternura e doçura. Dependendo a situação, contribuir para o desequilíbrio emocional de alguém. Confesso inclusive, que já fui várias vezes vítima disso.
Alguém argumentará que você não pode valorizar os comentários de alguns, o que é verdade. O problema é que na prática nem todos estão preparados para se blindarem de comentários indesejados e até mesmo porque o momento pode ser muito delicado. Se a vítima não deve esperar que seu "agressor" mude a postura (estou falando dentro desse contexto específico), você como suposta pessoa "dedutiva" e que até mesmo involuntariamente pode prejudicar alguém, deve usar esses exemplos como reflexão.
A verdade é que a conta chega para todos. Pessoas que costumam ser intrometidas, deduzem, especulam e espalham fatos sobre a vida de todos, muitas vezes se queixam da forma distante com que algumas pessoas as tratam. Não seria uma consequência?
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